Escritora descreve drama de abuso na infância no livro Tigre Tigre

Capa do livro

“Prefiro que minha filha morra em um acidente de trânsito a que seja molestada”. Esta é uma das afirmações que a escritora americana Margaux Fragoso, 32 anos, costumava ouvir do próprio pai na infância e que a inibiu por muitos anos de contar para a família que tinha sofrido abuso sexual de um homem 44 anos mais velho. No livro Tigre Tigre (Rocco, 352 páginas), recém-lançado no Brasil, ela descreve desde o primeiro contato que teve com o agressor até a confusão de sentimentos pelos quais passou (dos sete anos aos 17 anos). Ela também compara o poder destrutivo da pedofilia com o das drogas. “… é possível entender por que alguém tenta escapar do mundo usando drogas. As drogas cultivam uma falsa realidade, assim como os pedófilos. No fim, as drogas destroem sua vida, assim como esse tipo de ‘amor’.”, afirma a escritora em entrevista concedida à Revista Época.

Ela adverte que os pais devem tomar muito cuidado para não tratar as crianças vítimas de abuso como arruinadas. “Essa é a pior coisa que pode acontecer.” Minha resposta para isso é: o abuso sexual tem tratamento. Não é terminal. Pelo amor de Deus, todos precisamos parar de ser histéricos para que a criança possa de fato se recuperar. Muitos pais agem como se nunca fossem conseguir lidar com a situação se soubessem que seus filhos foram molestados. Por favor, lidem com isso, vocês são adultos. Se vocês conseguirem lidar, seus filhos conseguirão. Não passe a sua vergonha para o seu filho”, diz Margaux.

A autora toca também no assunto bastante polêmico, de que a criança possa sentir afeto pelo abusador. “O mito é de que uma criança nunca poderia nutrir sentimentos de amor e afeição por seu agressor; é esse mito que quero destruir. Porque, se a sociedade admitir toda essa complexidade, vai precisar refazer tudo dentro de um novo modelo, e trabalhar em busca de novas soluções. É mais fácil classificar essas situações em duas categorias bem distintas: pobre menina abusada e grande monstro mau. Mas esse tipo de pensamento nos ajudou a saber mais sobre esse tipo de relação, nos ajudou a preveni-lo?”.

Os problemas de autoestima das crianças vítimas de abuso sexual também são abordados pela autora. “Entrar no mundo do sexo tão cedo faz a pessoa sentir como se não tivesse vontade própria – como se fosse um objeto que pertence a alguém. Parei de ter relações sexuais com Peter aos 17 anos mas carreguei esse trauma profundo comigo muitos anos depois. Ser sexualizada na infância faz a pessoa sentir que a sexualidade não é dela.

Algumas mulheres podem não se sentir no direito de negar exigências dos homens no sexo; outras acham que não podem ter sexualidade alguma. Um preço muito grande, que às vezes dura a vida inteira, é pago para que o pedófilo tenha seus momentos de gratificação”.

Margaux defende ainda que a pedofilia precisa ser tratada em centros especializados, como ocorre com outras doenças como o alcoolismo e a bulimia. Entre as opções de tratamento estariam as drogas para inibir a testosterona, antidepressivos e terapia de grupo. “Há tanta ênfase em tratar as vítimas depois do abuso; por que não tratar os agressores e prevenir o problema?”

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