Coração Nazareno de Pernambuco é o único grupo feminino de maracatu no carnaval
Na terra dos maracatus, mulher não tinha vez. Em Nazaré da Mata, a 65 km de Recife (capital de Pernambuco), no carnaval, elas só podiam observar a típica dança masculina. Tudo mudou a partir de 2004, quando a Associação das Mulheres de Nazaré da Mata, a Amunam quebrou um tabu e criou o grupo Maracatu Coração Nazareno – o primeiro feminino do gênero no mundo. A estréia oficial foi realizada no ano seguinte no Encontro de Maracatus na Cidade Tabajara em Olinda.
De meninas de sete anos a senhoras de setenta anos, mulheres de todas as faixas etárias apresentam a mesma alegria nos encontros para se preparar para as apresentações e garantir a continuidade desse folguedo popular para as novas gerações. Nas oficinas de arte, elas confeccionam toda a fantasia e adornos para o desfile de maracatu, com predominância da cor rosa nas roupas, no estandarte e até nas perucas. Um dos desafios das mulheres foi confeccionar roupas um pouco mais leves, porque alguns acessórios, como os dos guerreiros dos maracatus costumam pesar até 30 quilos. Elas conseguiram diminuir para 16 kg, sem descaracterizar a vestimenta.
Pregando lantejoulas e outros adereços, elas discutem as chamadas “loas”, composições poéticas geralmente curtas, que levam o público a refletir por meio de versos sobre cidadania, gênero e violência. O canto entoado no carnaval expressa a memória local influenciada pela cultura africana. “O Maracatu Coração Nazareno é umas das formas que a Amunam encontrou para levar a delicadeza, a leveza, feminilidade e a fortaleza da mulher a um ambiente masculino”, afirma a coordenadora Eliane Rodrigues. “É uma forma de elas se tornarem agentes culturais e também de contribuir com o orçamento doméstico, confeccionando indumentárias ou com os cachês das apresentações artísticas”.
Antes da criação do Coração Nazareno, até a ala das baianas era formada por homens. Hoje, é formado por 70 mulheres e é o único feminino, entre os cerca de 25 grupos organizados de maracatu rural de Nazaré da Mata que apresentam-se no carnaval, com seu brilho, colorido e animação de reis, rainhas, baianas, caboclos de lança que dançam e cantam em homenagem aos orixás. Eles passam de pai para filho uma manifestação cultural criada no século 19 entre os trabalhadores rurais da região canavieira.
Hoje a associação é um ponto de cultura, promovendo a preservação do Maracatu de Baque Solte conhecido por Maracatu Rural, agregando outros grupos. Além de oferecer oficinas continuadas de artesanato, também produzem CDs com as músicas típicas criadas pelo grupo feminino e trabalham pela construção de uma política cultural na Zona da Mata de Pernambuco.