Abusador explora baixa auto-estima de adolescentes
Num bate-papo na internet, Annie inicia um romance online. Os pais sabem do relacionamento e até viram fotos do suposto adolescente, que dizia ter 16 anos. No entanto, não esperavam que ela viria a encontrá-lo pessoalmente sem avisá-los, um encontro que mudou drasticamente suas vidas. Na verdade, tratava-se de um abusador de 40 anos, que conseguiu ganhar a confiança dela e depois seduzi-la.
“O filme Confiar toca numa questão muito importante, porque quebra aquele modelo que o abuso sexual só acontece com famílias que já têm problemas, porque os pais tinham diálogo com os filhos e eram estruturados”, afirma Ana Maria Drummond, diretora executiva da Childhood Brasil, em debate realizado na pré-estréia do filme Confiar, dirigido por David Schwimmer (ator da série Friends).
Os adolescentes caem na conversa online dos abusadores por ingenuidade, ou falta de informação, segundo Renata Libório, psicóloga da Unesp e organizadora do livro “A exploração sexual de crianças e adolescentes no Brasil”. Ela também participou do debate promovido pela Childhood com apoio da revista Capricho no dia 23 de setembro último, respondendo às questões da platéia formada principalmente por estudantes.
“No filme, a garota tem uma família bem bacana, mas ele se aproveita do fato de ela se sentir excluída na escola e consegue se aproximar devagar com o discurso de que ela é linda”, afirma Renata.
Na avaliação da especialista, a relação que se estabelece com o abusador na internet é muito similar ao que acontece quando o abuso sexual é cometido por algum parente ou pessoa muito próxima da família. O autor do crime observa os traços de vulnerabilidade do adolescente e age quando a família não está por perto.
Os pais e adolescentes devem ficar atentos à dinâmica do papo. “O abusador induz a conversa de cunho sexual e chega ao ponto de acontecer como no filme, que ele manda foto de seu órgão genital”, diz a psicóloga.
Durante o debate, a platéia participa e mostra que todo mundo está exposto, contando, por exemplo, o caso de uma menina que pensava conversar na internet com um garoto da mesma idade, mas na verdade falava com uma mulher bem mais velha. Relatam também a história de uma garota da oitava série que fez um vídeo nua com o namorado e, quando eles terminaram, ele divulgou na internet.
“No filme, acho que os pais dela deveriam ter ficado mais atentos quando perceberam que o garoto era perfeito demais para ser real”, diz Anne Beatrice Drewes, 16 anos, aluna do colégio Porto Seguro, que desenvolve projeto na escola sobre como usar a internet com segurança, a partir da cartilha “Navegar com Segurança”, da Childhood Brasil. “A menina deveria ter avisado os pais quando foi ao shopping, como eu sempre conto para os meus onde estou indo, porque se acontecer algo eles podem me achar”, afirma. Ela também lembra que, normalmente, as pessoas mais velhas recomendam para não falar com estranhos, mas isso acaba aguçando mais a curiosidade do adolescente. Anne diz que é preciso tomar muito cuidado, porque não é confiável acreditar na pessoa nem se vir a imagem pela webcam. “Eu já vi gente que consegue manipular a foto e colocá-la se mexendo como se fosse real”.
A psicóloga Renata Libório defende que a prevenção ao abuso online deve ocorrer nas escolas desde os primeiros anos. Os educadores precisam levar informação sobre como usar a rede de forma segura e também ajudar a desenvolver a autoestima, porque os estudantes não podem ser ingênuos na internet.