Mídia pode levar mais informações para profissionais de saúde e educadores sobre o abuso sexual
Como a sociedade vê hoje o abuso sexual infantojuvenil. Há ainda há muitos mitos?
Sexo ainda é tabu, muitas pessoas acham vergonhoso denunciar e acreditam que a violência sexual contra crianças e adolescentes ocorre somente entre os mais pobres – o que não é verdade. A mídia tem mostrado que os casos de abuso são cometidos em todas as classes sociais e em todo o mundo, por médicos pediatras, padres e agora até por técnicos e treinadores esportivos.
Em sua opinião, como os profissionais de comunicação podem contribuir para prevenir e proteger as crianças de casos de abuso sexual?
A presença da mídia é superior à da lei, porque todo mundo tem acesso. Quando realizamos uma palestra sobre o combate ao abuso e à exploração sexual entre crianças e adolescentes conseguimos atingir alguns formadores de opinião, mas quando o assunto é abordado por um grande canal de televisão como a Rede Globo, abrange milhões de telespectadores de todas as camadas sociais. A mídia tem uma linguagem coloquial, de fácil entendimento. O papel dos veículos de comunicação tem sido fundamental, porque nem tudo se resolve apenas criando novas leis. É preciso mudar a cultura.
Depois do fechamento da Abrapia, de que forma o senhor continua trabalhando no enfrentamento ao abuso sexual infantojuvenil?
Sempre me envolvi demais com o meu trabalho e isso me trouxe ganhos e perdas, mas não me arrependo. A Abrapia acabou por problemas financeiros, mas como não poderia ficar parado, surgiu a idéia da criação do site Observatório da Infância, criado há três anos.
Hoje o site tem dois mil acessos por dia e recebo e-mails diariamente de pessoas pedindo autorização para utilizar o conteúdo. Escrevo ainda no meu blog pessoal, onde tenho liberdade para fazer críticas a todas as áreas e também estou em todas as redes sociais, Twitter, Facebook e outras. Eu atuo como médico, mas muita gente me vê um pouco como psicólogo, sociólogo e até jornalista (risos).
Ainda existe resistência de alguns profissionais de saúde para dar entrevista sobre o assunto?
Eu mesmo no início não gostava, mas depois que entendi o papel da imprensa passei até a ajudar mandando informações. Uma época, cheguei até a ser proibido de dar entrevista.
Aos profissionais das áreas de saúde cabe também colaborar com os jornalistas, dando entrevistas e informações, independente do veículo ser grande ou pequeno. Uma notícia num blog pode surtir grande repercussão e evitar o abuso sexual entre crianças e adolescentes.
O senhor acredita que o profissional de saúde ainda enfrenta muitas dificuldades ao lidar com a violência sexual?
Ainda falta muita informação, mas está melhorando com o passar dos anos. A Sociedade Brasileira de Pediatria vem atuando intensamente, discutindo o tema em cursos e palestras, coisa que há alguns anos não existia. É um trabalho lento, porque durante muitos anos o médico só olhava a parte orgânica do paciente.
O Judiciário também teve avanços. Em minha opinião, a área mais carente, infelizmente, continua sendo a Educação, e é a que mais precisa de informação. É o professor quem vai ver primeiro uma lesão, uma mancha de sangue, crianças usando roupas de frio no calor para cobrir ferimentos, marcas de cigarro e outros sinais de violência. A mídia deveria ouvir mais os educadores.