O lugar da infância nos direitos humanos
Ao longo da história, a infância esteve atrelada ao conceito daquele ou daquela que é inferior, que não têm direitos. O entendimento da criança como um ser detentor de direitos é ainda recente no Brasil. Foi só a partir do início da década de 1990 que a legislação brasileira reconheceu a criança como criança, e não como um “pequeno adulto”. “As leis garantiram que a criança fosse vista como um ser em desenvolvimento, sujeito de direitos”, afirma Itamar Gonçalves, gerente de programas da Childhood Brasil.
O primeiro marco legal relacionado aos direitos da infância no Brasil é o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990, que foi inspirado na Convenção das Nações Unidas pelos Direitos da Criança, de 1989. O Brasil foi o primeiro país a ratificar a convenção.
Ela representa um grande avanço em relação ao extinto Código de Menores de 1927 que via as crianças e os adolescentes como um “problema social”, os chamados “menores abandonados e delinquentes”, originários de famílias que seriam incapazes, indignas ou inadequadas para criar os seus filhos. O principal avanço é o de reconhecer crianças e adolescentes como sujeitos de direitos.
Com a Convenção e com o ECA, o Brasil deu um passo adiante em relação aos direitos da infância. Ambos deixam de tratar a criança como “menor” e reconhecem que elas são indivíduos que se encontram em um momento especial da sua formação, em um processo de desenvolvimento integral, que necessitam de cuidados especiais, atenção bastante especial por parte da sua família, dos seus cuidadores e de todo o seu entorno. “É dever de todo adulto zelar pelos direitos das crianças e dos adolescentes”, afirma Gorete Vasconcelos, coordenadora de programas da Childhood Brasil.
No entanto, a construção da infância no Brasil é pautada por questões socioculturais que perpassam a lei e que, muitas vezes, banalizam a violência na sociedade brasileira. Casos de violência doméstica, por exemplo, desde o abuso físico como o sexual e o psicológico, partem do pressuposto de que a criança é um objeto do qual a pessoa que comete o abuso dispõe da forma que ela quiser. “É uma lógica patriarcal, com fortes traços coloniais, escravocratas, cuja visão é de que se tem direito sobre o corpo de outra pessoa”, afirma Graça Gadelha, especialista em infância e consultora da Childhood Brasil.