Livro alerta para não silenciar diante de abuso sexual

“Não conte para a mamãe”. A frase dita pelo pai de Antoinette toda vez que ele a abusava sexualmente acompanhou a menina dos seis aos 14 anos. Essa história de silêncio, medo e violações vivida na Irlanda da década de 1950 é contada em primeira pessoa no livro “Não conte para a mamãe”, de Toni Maguire. Escrever foi a maneira que a autora encontrou para se livrar daquela Antoinette criança que desrespeitou a ordem de seu pai e contou uma única vez para sua mãe o que havia acontecido. A revelação não surtiu efeito. “Nunca, nunca mais fale disso de novo, está bem?”, disse a mãe, a pessoa que a menina mais amava e confiava. Esse foi o começou de quase uma década na qual Antoinette foi constantemente abusada pelo pai e silenciada pela mãe.

Depois de abusar da filha, o pai sempre a lembrava que era para manter “o nosso segredo”. E foi assim que a família mantinha o mito de uma “família feliz”, como Toni menciona diversas vezes no livro. Tanto os abusos quanto a dinâmica da família, formada pelo casal e por sua filha única, são contados por Toni. A solidão da menina ao mesmo tempo em que fez ela ter dificuldades de fazer amigos, contribuiu para que se tornasse uma grande leitora. Era nos livros que ela encontrava um respiro para uma infância marcada não só pelos abusos, mas por sadismo, violência física e assédio moral.

O silêncio tomou conta de si, assim como o desespero toda vez que ouvia o pai chegar em casa e a ordem de fazer um chá para ele. Essa era a senha para o início de mais um momento de terror, de abuso.  Quando Antoinette ficou grávida do pai, aos 14, ela achou que finalmente o inferno que havia vivido por mais de oito anos tivesse chegado ao fim. Estava enganada. Conforme seu pai sempre a advertia, era para ela se manter calada, pois “se soubessem a culpariam e a deixariam de amá-la”. E foi isso o que aconteceu. Apesar de o pai ter sido preso, o estigma e a culpa foram depositados na menina. Ela perdeu amigos, foi expulsa da escola e rejeitada pela família.

Quando seu pai saiu da cadeia, ele voltou a morar na mesma casa que ela e a mãe, que não fez nada para protegê-la. Antoinette foi, então, levada para um hospital psiquiátrico de onde saiu tempos depois. “Ela o amava mais”, conclui a hoje Toni, que por anos bloqueou a imagem da mãe ouvindo o relato de seu primeiro abuso sofrido. E se ela conseguiu superar a infância perdida, o livro retrata uma mágoa que vai existir para sempre: sua mãe morreu sem nunca ter pedido perdão à filha. Porém foi no enterro da mãe, que ela também enterrou Antoinette, o fantasma de sua infância, que finalmente descansou.

Livro: Não conte para a mamãe

Autora: Toni Maguire

Editora: Bertrand Brasil

Páginas: 307

Preço: R$ 29

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